quinta-feira, 11 de junho de 2009

''Meirelles peitou o mercado inteiro. Foi histórico''

Li a excelente entrevista do Mendonça de Barros depois de escrever o último post. Acho que ele está correto na análise da dinamica da taxa de cambio, ou então sou tão louco quanto ele.



Ex-presidente do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) e ex-ministro das Comunicações no governo Fernando Henrique Cardoso, o economista e engenheiro Luiz Carlos Mendonça de Barros é um grande crítico da sobretaxa de juros. Mas também vai contra a corrente que defende uma intervenção maior do governo no câmbio. Ontem, ele se disse muito surpreso com o que classificou como "atitude corajosa" do Banco Central e disse que o presidente da instituição, Henrique Meirelles, "peitou" o mercado. Mendonça de Barros foi um dos que haviam depositado todas as fichas na aposta de corte de 0,75 ponto porcentual. A seguir, os principais trechos da entrevista.

Como o sr. classifica o corte de 1 ponto porcentual?

Foi muita coragem do (Henrique) Meirelles. Ele peitou o mercado inteiro. Foi uma decisão histórica. O BC tem razão em dizer que não tem como comandar a taxa de câmbio, porque o real hoje se tornou moeda internacional. Mas, por causa disso, o BC também não tem o direito de manter a taxa de juros tão acima da de outros países, com uma inflação a quase 4,5%. A decisão, repito, histórica, foi nessa direção. Está certo que o PIB (Produto Interno Bruto, de -0,8% no primeiro trimestre) foi melhor do que se esperava, mas foi ruim ainda. Não sei se isso pesou na reunião, mas certamente pesou no mercado, que vai ter de se explicar, que projetou uma queda muito maior (para o PIB do período). É muito cedo ainda para definir.

O que esse corte indica para o futuro?

Uma expectativa de a Selic chegar a, pelo menos, 8,75% na próxima reunião do Copom. Meu número é até um pouco mais baixo. Mas eu não esperava que o BC tivesse coragem para promover essa queda de um ponto, que certamente terá as razões explicadas na ata. Agora, é histórico porque ele peitou o mercado e geralmente o BC não faz isso. O que vamos ver na sexta-feira (primeiro dia útil após a decisão) é como o mercado vai trabalhar com a taxa longa. Porque a taxa longa, de um ano, que corrige o crédito, já está a 12%, o que é alto comparado a outros países.

Que taxa de juros hoje acompanharia de forma mais eficiente o câmbio no nível em que está?

Acho que temos de construir essa taxa através do juro real. Se ponderar que a inflação está ancorada numa expectativa de 4,5%, uma taxa de 8,5% já estaria num nível alto comparado a outros países.

E qual o nível ideal?

Não tem nível ideal. Minha tese é que o BC, por razões históricas, sempre trabalhou com taxa de juros real maior do que eventualmente fosse necessário para estabilizar a inflação na meta, porque o nosso passado nos condena. Só que isso mudou agora, com o real como moeda forte. Portanto, o BC não tem mais condição de manter uma sobretaxa de juros diante de um real que o mercado internacional vai arbitrar. O real hoje é uma alternativa para quem tem ativos em dólar. Essa é a novidade, que estou rouco de tanto falar e as pessoas ficam pensando que eu sou louco. Eu posso ser um monte de coisas, mas louco, não. E aí temos de acompanhar o mercado com a internacionalização da nossa moeda.

Essa valorização do real não é artificial, então, na sua opinião?

Não tem nada artificial. E não é valorização do real, mas desvalorização do dólar em relação a moedas que são mais confiáveis hoje. Esse é o movimento que está acontecendo. Está todo mundo com medo do dólar, sobreaplicado em dólar, e aí começam a aparecer alternativas, como o real. O endividamento será menor nos próximos dois anos, a economia brasileira está crescendo e vai continuar e isso o Banco Central tem de considerar. Não dá para serem cautelosos demais. Tem até outra palavra, mas não gosto de usar. Fico satisfeito de ver que eles perderam um pouco isso.

O sr. quer dizer que o Banco Central abandonou o conservadorismo?

Não é conservadorismo pelo seguinte: como temos um passado de inflação que nos condena, o BC sempre preferiu errar para mais. Só que isso não dá para fazer mais por causa da internacionalização do real.

O sr. chegou a defender uma Selic de 8% e, se a economia não aguentasse, o retorno a um nível mais alto. Esse vaivém não seria mais prejudicial?

Bem, primeiro acho que aguenta hoje 8%. Segundo, é uma fronteira nova e quando se lida com coisas novas, não tem a história para trás para te ajudar, então se tem de correr um certo risco. Não acho que vai acontecer nada. Essa decisão é histórica e a frase que já falei várias vezes é: "Não cobrem o Banco Central porque ele não tem como interferir na taxa de câmbio". Agora, o BC não pode trabalhar com uma taxa de juros real tão diferente da de outros países.

Fonte: O Estado