Artigo interessante e otimista do Nakano sobre o impacto da queda do muro de Berlin e a recente crise econômica no debate econômico. Não concordo totalmente com os argumentos apresentados: ele exagera, por ex. o papel do Estado e não menciona o papel dos cursos de pós graduação(mestrado e doutorado)brasileiros na formatação e manutenção da agenda econômica e da linha teorica ainda dominantes. A linha teorica da escola que ele dirige não é em nada diferente das que ele implicitamente critica no texto. Difícil imaginar uma agenda diferente, exceto pela retórica.
O colapso do bloco soviético escancarou o fracasso do planejamento central e acabou com o seu mito. A queda do Muro de Berlim, em 1989, marcou o fim da ideologia do socialismo autoritário abraçado pelas esquerdas e, desde então, passou a prevalecer o outro extremo conservador com o mito do mercado livre, eficiente e que se autorregula. A grande crise e o colapso do sistema financeiro nos EUA e na Europa, em 2008, tornaram a intervenção maciça do Estado uma necessidade absoluta, marcando o fim dessa ideologia neoliberal.
Com o degelo das duas ideologias e a destruição de dois mitos poderosos, o planejamento central e o mercado livre e eficiente, abre-se neste início de década um período que deverá ser muito fértil para a revisão de todo o pensamento econômico com grande liberdade de pensar e abrindo espaço para posições mais pragmáticas e livres dos grilhões das ideologias e dos mitos.
As consequências desse degelo das grandes ideologias terão enorme repercussão. No Brasil, sabidamente a partir da década de 90, a opinião pública foi dominada pelo pensamento neoliberal. As políticas públicas passaram a ser formuladas com base na perspectiva de que, quanto menos Estado, melhor.
Mas os setores que abraçaram o neoliberalismo no Brasil, aliando-se politicamente aos conservadores, não levaram até as últimas consequências a destruição do Estado. Retirou-se da função-objetivo do Estado a promoção do desenvolvimento econômico e mesmo a geração de emprego. Destruiu-se a capacitação técnica de pensar e planejar a longo prazo e, estrategicamente, o futuro do país, supostamente um segmento dominado pelas esquerdas intervencionistas, e manteve-se intacto dentro do Estado o atraso: o segmento patrimonialista, clientelista e burocrático. Paradoxalmente, o neoliberalismo brasileiro impõe uma carga tributária e um imenso custo Brasil que sufocam o mercado.
Agora, abre-se um período de reflexão sem os mitos e dogmas do livre mercado que cerceavam o livre pensar, estabeleciam os limites do que pessoas sérias e respeitáveis poderiam falar. Falar em desenvolvimento econômico deixou de ser assunto de economista desocupado, como censurava um ministro do governo anterior. A política macroeconômica está incorporando o crescimento e a geração de emprego como seus principais objetivos. Controlar o fluxo de capitais e administrar a taxa de câmbio está deixando de ser uma obscenidade. Deficit público para fazer política anticíclica tem o apoio de todos. O Banco Central, pelo resultado da última reunião do Copom, parece começar a se libertar da cegueira imposta pelo pensamento ortodoxo. Com isso, abre-se a possibilidade de nos livrarmos da taxa de juros mais alta do mundo e da taxa de câmbio apreciada que está desindustrializando e transferindo empregos para o exterior.
Em suma, o Brasil está se libertando dos grilhões e da cegueira imposta pelo pensamento dominante no último quarto de século. Com isso, caminhamos para maior pragmatismo e convergência de pensamento, com perspectivas de retomarmos o projeto nacional de desenvolvimento, interrompido em 1980.
Fonte: FSP