Excelente artigo do Frankel sobre um tópico que deverá dominar o debate macroeconômico em 2013: o que colocar no lugar do modelo de metas para a inflação...
É hora de os principais bancos centrais do mundo reconsiderarem a forma como conduzem sua política monetária. O Federal Reserve (Fed, autoridade monetária dos Estados Unidos) e o Banco Central Europeu (BCE) estão às voltas com à persistência da fragilidade em suas economias, apesar de anos de baixas taxas de juros. No Japão, Shinzo Abe, eleito primeiro-ministro do Partido Liberal Democrático (PLD), fez campanha a favor de uma política monetária mais expansionista. E os bancos centrais no Reino Unido e China trocarão de comando, o que pode implicar novas mentalidades.
As autoridades monetárias em alguns países deveriam contemplar uma mudança em direção à adoção de metas para o Produto Interno Bruto (PIB) nominal - alteração que poderia ser adotada de forma gradual, para preservar a credibilidade em relação à inflação. Aliás, para muitas economias avançadas, em particular, uma meta para o PIB nominal seria claramente superior para o status quo.
Bancos centrais anunciam regras e metas em termos de alguma variável econômica para comunicar suas intenções ao público, assegurar a prestação de contas e ancorar as expectativas. Já fixaram o preço do ouro (sob o padrão-ouro); tiveram metas para a base monetária (durante o auge do monetarismo do início dos anos 80); e metas para as taxas de câmbio (que ajudaram os países emergentes a superar a inflação muito alta dos anos 80 e foram usadas por membros da União Europeia nos 90, durante o avanço em direção à união monetária). Cada um desses planos, em algum momento, foram abandonados, seja por falta de ouro, mudanças na demanda por dinheiro ou por uma década de ataques especulativos que deslocaram o patamar das moedas.
A ideia predominante nos últimos dez anos foi a de que as metas para a inflação - ou seja, anunciar uma meta de crescimento para os preços ao consumidor - proporcionavam a melhor estrutura para a política monetária de um país. A crise financeira mundial iniciada em 2008, no entanto, revelou algumas desvantagens das metas inflacionárias1, análogas aos defeitos das metas cambiais, que ficaram vulneráveis às crises de câmbio da década de 90.
A vantagem da meta de PIB nominal em relação à de inflação é sua solidez, em particular no que se refere a choques de oferta e choques das relações de troca. Por exemplo, com uma meta de PIB nominal, o BCE poderia ter evitado o erro cometido em julho de 2008, quando reagiu à alta dos preços do petróleo elevando as taxas de juros2 para combater a inflação ao consumidor, logo quando a economia entrava em recessão. Da mesma forma, o Fed poderia ter evitado o erro de adotar um afrouxamento excessivo na política monetária em 2004-2006 (quando a expansão do PIB nominal superou os 6%).
A ideia de metas para o PIB nominal circula desde os anos 80, quando macroeconomistas a viram como a solução lógica para as dificuldades com o sistema de metas de base monetária, particularmente, em relação aos choques de velocidade. Essas propostas foram retomadas agora, em parte, para proporcionar estímulos monetários e maior crescimento nos EUA, Japão e Europa, enquanto ainda se mantém uma âncora nominal confiável. Em economias que oscilam entre recuperação e recessão, uma meta de crescimento do PIB nominal de 4% a 5% para o ano seguinte teria impacto equivalente ao de uma meta de inflação de 4%.
Algumas autoridades monetárias deparam-se com o problema do limite de queda dos juros a zero: as taxas de juros nominais de curto prazo não podem ficar mais baixas do que já estão. Alguns economistas propuseram3
combater o alto desemprego elevando a meta de inflação anual dos tradicionais 2% a 4%, reduzindo a taxa de juros real (ajustada pela inflação). Eles lembram ao presidente do Fed, Ben Bernanke, que ele fez recomendações similares4 às autoridades japonesas, há dez anos.
Mas outras autoridades monetárias são avessas a metas de inflação de 4% - ou mesmo de 3%. Temem abandonar uma meta duramente conquistada e que foi bem-sucedida em manter as expectativas inflacionárias bem ancoradas por tantos anos. Mesmo se o aumento fosse temporário, poderia provocar danos à credibilidade da âncora de longo prazo.
Esse também é motivo pelo qual as mesmas autoridades monetárias têm receios quanto às propostas de meta do PIB nominal. Temem que determinar uma meta de expansão de 5% ou mais do PIB nominal para o próximo ano seria naturalmente interpretado como determinar uma meta de inflação superior a 2%, prejudicando, da mesma forma, a credibilidade da âncora de forma permanente.
O compromisso de meta de inflação de 2%, contudo, não seria abandonado. A solução prática é adotar a meta de PIB nominal gradualmente. As autoridades monetárias deveriam começar omitindo projeções públicas de inflação e de crescimento real de curto prazo, mantendo as projeções de longo prazo e a regulagem da inflação da forma como está. Mas deveriam agregar uma projeção de longo prazo para o crescimento do PIB nominal. Seria de algo de 4% a 4,5% para os Estados Unidos, o que implicaria um crescimento real de longo prazo de 2% a 2,25%, o mesmo de agora. Para o Japão, seriam necessárias metas menores - talvez, de crescimento de 3% do PIB nominal, como o PLD propôs recentemente - em grande parte devido à ausência de crescimento populacional. Ninguém poderia dizer que são inflacionárias.
Pouco depois, seriam agregadas as projeções de crescimento nominal do PIB para os próximos três anos - acima de 4% nos EUA, Reino Unido e região do euro (talvez de 5% para o primeiro ano, subindo a 5,5% depois disso, mas com a projeção de longo prazo ficando inalterada, em 4% a 4,5%). Isso desencadearia grande especulação pública sobre como esses 5,5% se decomporiam entre crescimento real e inflação. A verdade é que os bancos centrais não têm controle sobre isso - a política monetária determina o total de inflação e crescimento real, mas não a magnitude relativa de cada uma.
Uma meta de PIB nominal asseguraria que o crescimento real se acelerasse ou, caso contrário, que a taxa real de juro caísse, elevando a demanda. No longo prazo, quando crescimento nominal do PIB estiver de volta a seu ritmo anual de 4% a 4,5%, o crescimento real voltaria a seu potencial de, digamos, 2% a 2,5%, com a inflação de volta à faixa de 1,5% a 2%.
Adotar uma meta de crescimento do PIB nominal de forma gradual tem a vantagem de trazer algum estímulo econômico agora, quando é necessário, enquanto respeita a relutância das autoridades monetárias em abandonar sua tão estimada meta de inflação.
Jeffrey Frankel é professor de crescimento e formação de capital na Harvard University
Fonte: Valor