sexta-feira, 8 de fevereiro de 2013

Inflação


A alta da inflação em janeiro já era esperada devido a inflação dos alimentos causada por problemas climáticos. A oferta de alimentos in natura sofreu forte impacto negativo devido as chuvas do período e consequentemente os seus preços aumentaram significativamente. É um aumento de preços que não deverá se repetir na mesma magnitude nos próximos meses e no segundo semestre, com a boa safra esperada para este ano, deverá apresentar ajudar na redução da inflação. Por enquanto não há razões para duvidar do cenário apresentado pelo Bacen sobre a dinamica da inflação ao longo do ano. Há, contudo, riscos na estratégia adotada de crescimento com inflação próxima do limite superior da meta. Inflação alta por um longo período em uma economia ainda muito indexada impacta negativamente sobre as expectativas e poderá tornar ainda mais difícil atingir a meta ou dela se aproximar. Paises como o histórico de inflação muita elevada são como alcoolatras: uma dose é suficiente para colocar em risco o sucesso atingido...

O artigo abaixo é muito bom e levanta questões fundamentais sobre a dinamica da inflação e sugere medidas corretas, na opinião deste blogueiro, para reverter o quadro inflacionário.



Segundo o IBGE, o IPCA fechou 2012 com uma alta de 5,8% - abaixo dos 6,5% de 2011 e dos 5,9% de 2010, mas ainda assim bem acima do centro da meta (de 4,5%). Com efeito, na média dos últimos três anos a alta foi de 6,1%.

Contudo, para analisar a dinâmica recente da inflação, não é correto fazer uma comparação direta dos percentuais de 2012 com aqueles dos anos anteriores. Isso porque o IBGE introduziu uma atualização metodológica a partir de janeiro de 2012 - uma nova estrutura de ponderação baseada na Pesquisa de Orçamentos Familiares (POF) de 2008-09 (em substituição à estrutura anterior, baseada na POF 2002-03).

Trata-se de uma alteração correta e necessária, na medida em que é amplamente sabido dentre os estudiosos de índices de preços que, quanto maior o lapso de tempo para executar essa atualização, maiores as distorções (a inflação tende a ser superestimada).

Diante disso, a LCA construiu uma série retroativa do IPCA. Ela aponta que a desaceleração de 2011 para 2012 foi pequena, de 6,1% para 5,8% (vinda de 4,7% em 2009-2010). Ou seja: o IPCA passou de uma alta bem próxima ao centro da meta em 2009-10 para uma variação beirando o teto em 2011-12.

Nesse ínterim, a alta média do PIB passou de 3,6% (2009-10) para 1,9% (2011-12). A teoria econômica nos diz que crescimento econômico menor combinado com inflação mais alta é um sintoma clássico de choque de oferta adverso. E esse choque não parece ter sido associado a uma redução do PIB potencial, já que ele passou de 4%/4,5% até 2009/10 para 3,5%/4% em 2012.

Não obstante, tanto a economia mundial como a brasileira sofreram com alguns choques adversos bastante severos de preços agropecuários e de petróleo desde meados de 2010, cujos efeitos inflacionários foram potencializados no Brasil por conta da ainda elevada indexação, formal e informal, de vários preços (salários inclusive) e contratos.


No 2º semestre de 2010, os preços internacionais das commodities agrícolas alimentícias subiram quase 40%. Entre o último trimestre de 2010 e o 1º de 2011, os preços do algodão no mercado internacional subiram 150%. Nesse mesmo período, o preço internacional do petróleo subiu mais de 40% - elevação que não chegou a ser repassada integralmente para os preços de combustíveis no Brasil, mas chegou à nafta. Logo no começo de 2011, um problema de oferta doméstico fez com que os preços do etanol disparassem, puxando a gasolina.

Entre meados de 2011 e de 2012 houve uma gradativa normalização dessas adversidades. Tanto é que, em julho do ano passado, a expectativa mediana dos analistas era de um IPCA fechando 2012 com alta de 4,9% (com um PIB crescendo 2% na média do ano, mas acelerando para pouco mais de 4% na segunda metade de 2012).

Mas veio um novo choque e a inflação foi a quase 6%, mesmo com o PIB tendo crescido apenas 1%. Dessa vez, a seca tanto nos EUA (com impactos sobre os preços dos grãos) como no Brasil (com impacto sobre os preços de produtos in natura) foram os vilões. Os preços de bens não duráveis subiram quase 9% em 2012. Tivessem eles subido no mesmo ritmo de 2009-11 (5,5%), o IPCA teria fechado o ano passado algo abaixo de 5%. Vale destacar que parte dessa aceleração se deveu ao forte aumento de impostos sobre cigarros e bebidas frias, cujo impacto combinado sobre o IPCA foi maior que o alívio do IPI dos carros novos.

Todas essas constatações sugerem que a observação de uma medida de núcleo de inflação que expurgue preços de alimentos e combustíveis/energia (que são muito voláteis e sujeitos a choques) é bastante pertinente para se analisar a dinâmica inflacionária.


Essa medida de núcleo evidencia o fato de que a inflação brasileira foi muito afetada pelos vários choques de oferta descritos acima: alimentação e combustíveis/energia (30% do IPCA), a inflação foi de 4,7% em 2009-12 e passou de 6% em 2011 para 4,7% em 2012.

Isso não quer dizer que a inflação desse subgrupo deve ser ignorada. Afinal, sua evolução afeta o poder de compra da população e também pode se espraiar para os demais preços da economia. Ademais, a meta de inflação é definida em termos do IPCA cheio.

Mas uma observação e entendimento mais cuidadosos da evolução passada da inflação e de seus condicionantes são cruciais para aquilatar sua trajetória futura e também podem ajudar a compreender algumas posturas de nosso BC - que vem encarando o dilema de como lidar com vários choques de oferta adversos em uma economia em que a indexação formal e informal de preços é muito elevada. O próprio Tombini, em declaração recente, reconheceu que a inflação "basal" brasileira é elevada (desde 1999, o IPCA ficou abaixo de 5,5% somente em 2006, 2007 e 2009).

Essas constatações sugerem que, caso o Brasil queira reduzir sua inflação para algo entre 3% e 4% de forma sustentável, a utilização apenas da política monetária pode ser contraproducente. Corremos o risco de ter uma inflação apenas um pouco menor, ao custo de um juro real muito mais elevado e de um crescimento econômico muito mais baixo.

Assim, é preciso reduzir a indexação, com medidas como: 1) fim dos reajustes acima da inflação do salário-mínimo nacional (que vale, por ora, até 2015) e também dos mínimos regionais; 2) desindexação dos contratos de índices como o IGP-M; 3) seguir mudando a sistemática de reajustes de vários preços monitorados (alguns deles ainda são indexados aos IGPs e não repassam parte dos ganhos de produtividade para os consumidores). Paralelamente a isso, medidas que reduzam os custos de produção (como desoneração de impostos ou encargos e melhoria da infraestrutura) precisam ser aprofundadas.

Bráulio Borges é economista-chefe da LCA Consultores

Fonte: Valor