quinta-feira, 27 de junho de 2013

Entrevista com Joseph Stiglitz

Valor: Como o sr. avalia a onda de pessimismo sobre emergentes?

Ele esta correto: "Muito do dinheiro gasto pelo Brasil para reduzir pobreza e fome foi muito bem gasto"

Joseph Stiglitz: Há, sem dúvida, uma desaceleração nos mercados emergentes, mas eu continuo muito otimista sobre o dinamismo dessas economias. E ainda mais quando comparamos com a recessão na Europa. Os emergentes também são mais dinâmicos do que se pode ver em boa parte dos Estados Unidos. A crise na zona do euro não acabou, os europeus não resolveram seus problemas. A crise política nos Estados Unidos também não acabou, mas felizmente a economia é suficientemente forte.

Valor: Qual a dimensão do impacto da retirada do afrouxamento quantitativo sobre os emergentes?

Stiglitz: A ironia é que o afrouxamento quantitativo não teve muito impacto nos Estados Unidos. Foi desenhado para estimular a economia americana, mas teve pouco efeito. O dinheiro não foi para onde era necessário. O impacto tem sido maior nos preços de ativos dos emergentes. A preocupação agora é com a magnitude global dessa retirada do QE3.

Valor: O que os emergentes devem fazer nesse cenário?

Stiglitz: Eles devem reconhecer que vai haver uma reversão da apreciação (da moeda), isso é bom. É preciso gerir isso, reconhecer que o mercado financeiro é instável e que são obrigados a intervir. O crescimento econômico pode se beneficiar de câmbio desvalorizado, mas o problema são os riscos no curto prazo.

Valor: Como o sr. interpreta os protestos de rua em países emergentes, como agora no Brasil?

Stiglitz: Acho que, no caso do Brasil, o país tem tido um grande sucesso nos últimos 20 anos, melhorando educação, reduzindo pobreza, fome, desigualdade. E uma interpretação ao que está acontecendo é que as aspirações excederam as mudanças, as aspirações se aceleraram.

Valor: Com desenvolvimento econômico, as demandas aumentaram?

Stiglitz: Exato. São questões legítimas na democracia. Temos esta questão nos Estados Unidos: como gastar bem o dinheiro público? Em Nova York protestamos quando o governo gasta o dinheiro em estádios, mas há outras pessoas que argumentam que isso é importante para gerar crescimento e atividade econômica. Eu acho que isso não é a melhor maneira de gastar dinheiro público, e compreendo que é uma questão legítima no debate público.

Valor: E sobre o modelo de crescimento?

Stiglitz: Não penso que haja no Brasil pessoas reclamando sobre muito consumo, mesmo havendo ambientalistas que se inquietam sobre os impactos. O que isso realmente reflete é a importante ideia levantada por nossa Comissão Internacional de Medida de Desempenho Econômico e Social (criada pelo governo francês em 2008, presidida por Stiglitz). PIB não é uma boa medida de bem-estar social. E, de alguma maneira, há muita gente dizendo nas ruas que concorda conosco. Os manifestantes estão dizendo que é tempo para um diálogo público mais amplo sobre essas questões.

Valor: A questão é gastar melhor os recursos públicos?

Stiglitz: Muito do dinheiro gasto pelo Brasil para reduzir pobreza e fome foi muito bem gasto. E, como americano, quando eu vejo que nós gastamos dinheiro na área militar, subsidiando grandes empresas, bancos, acho que devemos pensar bem nas comparações. É legítimo que os cidadãos digam nesse caso que não estão gastando bem o dinheiro público. Devemos lembrar que muito dinheiro foi bem gasto no Brasil com coisas interessantes, basta ver as melhoras dramáticas nas estatísticas do país e quão inusual isso ocorreu, tão rapidamente.


Fonte: Valor