sábado, 10 de janeiro de 2009

Marxismo e pensamento econômico brasileiro

É um artigo antigo, mas muito interessante, sobre um tema que transformou-se na nova jabuticaba, o marxismo. O "paper" apresenta um balanço da influência do marxismo no pensamento econômico brasileiro no pós-guerra. Há ótimos economistas brasileiros influenciados pelo Marx, alguns ainda se consideram marxistas, outros neo-marxistas. Naturalmente, para os fundamentalistas do marxismo radical chic de perdizes-higienopolis, esses economistas não são marxistas. É o tipo de crítica que constitui-se em grande elogio.


A influência do marxismo no pensamento econômico brasileiro é um tema que se pode tratar a partir de duas perspectivas. A primeira e mais difusa diz respeito aos economistas que, mesmo sem estarem identificados com o pensamento de Marx, não deixam de reconhecê-lo ou de sentir sua presença, em particular nas assim chamadas questões sociais e em temas associados ao atraso relativo das nações. Nesse sentido genérico, pode-se afirmar que a influência do marxismo atinge inúmeros economistas brasileiros; entre outros, Celso Furtado fez referências atentas às idéias de Marx sobre o desenvolvimento econômico (1).

Mas é a uma segunda e mais restrita perspectiva — a dos autores e obras que se propõem a seguir a metodologia e/ou a pauta de reflexões do marxismo — que a análise feita no presente artigo se dirige. Nesse terreno, e a despeito da existência de opiniões ponderáveis em contrário (Konder, 1991; Mantega, 1995), é possível sustentar que a economia política marxista não exerceu um impacto decisivo no pensamento econômico brasileiro (2). O caso foi bem outro: com raras exceções, a obra dos economistas assumidamente marxistas permaneceu imersa no caudal do desenvolvimentismo, raramente se distinguindo e/ou estabelecendo argumentos originais. Estudar as razões dessa falta de identidade e pontuar as raras exceções relevantes, ou seja, identificar sinais de vida no marxismo econômico brasileiro, constitui o objetivo do autor neste trabalho.

Em seu monumental estudo sobre o pensamento econômico brasileiro no ciclo do desenvolvimentismo, Bielschowsky (1988) chamou atenção para a dependência dos economistas socialistas às vicissitudes e aos vaivéns políticos das correntes de esquerda. Posição semelhante foi adotada por Mantega (1987), que propôs até mesmo uma tipologia dos economistas marxistas brasileiros com base na filiação às grandes correntes políticas do marxismo internacional.

As observações destes dois autores apenas confirmam o fato de que, por ser uma doutrina preponderantemente orientada para a ação, o marxismo dificilmente consegue desvincular-se do cenário contingente das lutas políticas e das propostas de transformação social. Nesse particular, no entanto, a diferença entre os autores marxistas e os demais não seria tão marcante, já que os mais proeminentes economistas brasileiros se destacaram justamente pela atenção aos problemas do desenvolvimento nacional e por um certo pragmatismo na reflexão; enfim, por darem importância às circunstâncias políticas.

A característica do pensamento econômico marxista residiria menos no domínio de sua agenda de investigações pelas circunstâncias políticas, do que na existência de uma moldura partidária na reflexão. De fato, especialmente entre as décadas de 40 e 70, a discussão marxista no Brasil foi muito pautada por ideários e formas de ação partidárias (contra e a favor), pelas idas e vindas do movimento comunista e por um imenso apetite em enfrentar controvérsias internas às correntes de esquerda. Menos afetados pelos compromissos partidários e mais comprometidos com a execução da política econômica e/ou com a visão dos organismos internacionais de desenvolvimento econômico, os economistas não-marxistas foram mais pragmáticos na ação.

Mauricio Coutinho

Para ler o resto do artigo clique