quinta-feira, 23 de abril de 2009

Um futuro de inflação para os EUA

Interessante artigo do Feldstein sobre as possíveis consequencias da atual política econômica americana

"Os EUA demonstraram seus primeiros sinais de deflação em 55 anos, o que despertou temores inevitáveis de ainda mais deflação no futuro. Mas o motivo primário para o índice negativo de inflação nos EUA é a dramática queda de 30% nos preços das commodities. Isso não voltará a acontecer. E, excluídos alimentos e energia, os preços ao consumidor estão 1,8% acima do nível do ano anterior. Essa é a boa notícia; já as perspectivas de longo prazo são piores.
A explosão no déficit fiscal americano acarreta o espectro de inflação alta no futuro. A proposta orçamentária de Obama implica um déficit fiscal de 13% do PIB em 2009 e de quase 10% em 2010. Mesmo com forte recuperação econômica, a relação dívida/ PIB dobraria para 80% ao longo dos próximos dez anos.
Há indícios históricos sobre a conexão entre uma política fiscal expansiva e subsequente inflação. Mas as provas históricas e a análise econômica também demonstram que os efeitos inflacionários podem ser evitados caso os déficits fiscais não sejam acompanhados por uma alta sustentada na base monetária e, em termos mais gerais, por um relaxamento das condições monetárias.
O fato essencial é que a inflação sobe quando a oferta excede a procura. Um déficit fiscal eleva a oferta quando o governo amplia suas aquisições de bens e serviços ou, por meio de uma redução de impostos, induz os domicílios a ampliar seu consumo. Determinar se esse déficit mais amplo conduzirá a um aumento de preços depende das condições monetárias. Caso o déficit não seja acompanhado por uma alta na base monetária, o estímulo fiscal elevará as taxas de juros de curto prazo, bloqueando a alta na oferta e prevenindo uma alta sustentada na inflação.
Assim, o potencial perigo inflacionário é que o grande déficit fiscal dos EUA conduza à elevação da base monetária. Isso acontece nos países em desenvolvimento, pois eles não dispõem da capacidade de emitir títulos e por isso financiam suas dívidas imprimindo dinheiro. Em contraste, quando os déficits não conduzem à ampliação na base monetária, as provas apontam que não causam alta sustentada de preços.
Um exemplo disso foi a forte queda na inflação que os EUA registraram no começo dos anos 80, ao mesmo tempo em que os déficits fiscais subiam rapidamente. A inflação caiu porque o Fed apertou os controles sobre as condições monetárias e permitiu que os juros de curto prazo subissem de forma acentuada.
Mas agora os grandes déficits fiscais estão sendo acompanhados por alta rápida na base monetária e ampliações ainda mais ominosas nas reservas dos bancos comerciais, que podem depois se converter em forte crescimento da base monetária.
A base monetária consiste de depósitos bancários garantidos pelo governo, que os domicílios e empresas vêm mantendo devido a preocupações quanto à liquidez e à segurança de outras formas de investimento. Mas isso poderia mudar quando as condições melhorarem, o que transformaria esses saldos monetários em fontes de inflação.
A recessão significa que não há risco imediato de inflação. A procura agregada por mão de obra, bens e serviços é muito inferior à oferta potencial. Mas, quando a economia começar a se recuperar, o Fed terá de reduzir os estoques de dinheiro e impedir que o grande volume de reservas excedentes dos bancos venha a causar uma explosão inflacionária de crédito e da base monetária.
Essa não será uma tarefa fácil, pois os bancos comerciais podem não desejar trocar suas reservas pela montanha de títulos privados que o Fed retém, e podem faltar ao banco central papéis do Tesouro com os quais conduzir operações no mercado. É surpreendente que os juros de longo prazo ainda não estejam refletindo o risco de inflação futura resultante."

MARTIN FELDSTEIN , professor de Economia na Universidade Harvard, é membro do Conselho de Assessoria sobre Recuperação Econômica de Barack Obama.