terça-feira, 24 de agosto de 2010

Ainda o aperto econômico



Comentário do VTF à manchete de ontem do jornal onde ele trabalha. Ele é um bom analista econômico, algo raro no grande bananão.



Em maio, Dilma Rousseff (PT) foi a Wall Street dizer que:
1) A política macroeconômica em seu eventual governo ainda será orientada pelo objetivo de reduzir a dívida pública, por meio de superavit primários relevantes, e de diminuir os juros, por meio da política de metas de inflação, as quais seriam gradualmente reduzidas;
2) A dívida líquida cairia para 30% do PIB em 2014, o que é bem factível. Em conversa reservada, disse que gostaria de baixar a taxa real de juros básica para "perto de 3%, mas sem fazer mágica";
3) O Banco Central continuará operacionalmente autônomo. Seu presidente ainda terá status de ministro. Ou seja, nada muda: nem mais nem menos autonomia;
4) O aumento do crédito por meio de bancos públicos chegou "ao limite"; é preciso estimular o crédito de longo prazo por meio de incentivos a fundos de pensão e ao mercado de capitais. É preciso tirar do BNDES a responsabilidade pelos financiamentos compridos e volumosos;
5) A difícil reforma tributária é uma de suas prioridades.
A campanha de Dilma reafirmou várias dessas diretrizes e revelou a intenção da candidata de levar o superavit primário, a poupança do governo desconsiderados gastos com juros, de volta a 3,3% do PIB.
Tais ideias do comando dilmista foram publicadas ontem, nesta Folha, em reportagem de Kennedy Alencar e Valdo Cruz. O texto foi traduzido na manchete do jornal como "Dilma estuda aperto econômico". Em "solo nacional", seria a primeira conversa séria desta campanha.
Ontem ainda, Dilma negou que sua campanha discuta tais coisas: "Lamento, mas vou desmentir".
Dilma não poderia dizer outra coisa, claro. De outro modo, a campanha adversária poderia alardear "Dilma promete arrocho" etc. O de sempre. Mas o que está em estudo ou se conversa na campanha da candidata é aquilo mesmo que está no texto de Alencar e Cruz. Se, uma vez no poder, Dilma mudaria de ideia ou seria incapaz de implementá-las, são outros quatrocentos.
Note-se que o comando de Dilma difunde tais informações de propósito. Trata-se de uma espécie de "bilhetinho aos brasileiros", parodiando a "Carta aos Brasileiros" de Lula, na campanha de 2002.
Foi por meio desse discurso que o PT trocou sua roupa ideológica em público, quando as finanças do país derretiam e o "mercado" estava em polvorosa com a perspectiva de que os petistas cumprissem seu programa econômico doidivanas.
Por fim, é preciso lembrar que os "estudos" da campanha dilmista estão no centro do debate econômico. Não vai haver mais investimento, capital privado de longo prazo, distribuição de renda e, quiçá, impostos menores se a taxa de juros não baixar. A fim de baixar os juros, é preciso levar a dívida pública para 30% do PIB ou menos, e rápido. Para tanto, é preciso mais superavit primário: "aperto econômico".
É possível fazer um governo de esquerda ou "democrático e popular" baixando a dívida. Aliás, é preciso. Para início de conversa, dívida alta leva dinheiro para quem já o tem (quem empresta ao governo). Para pagar a dívida, cobra-se relativamente mais imposto de quem é pobre. Se, como o comando de sua campanha o dizia ainda ontem, Dilma está preocupada com esses problemas, isso é boa notícia.

Fonte: FSP