terça-feira, 21 de dezembro de 2010
O IPEA é de todos?
O IPEA deveria ser de todos e não desta ou daquela instituição do Rio, SP ou qualquer outro Estado do grande bananão. Infelizmente, isto nunca foi o caso e melhor seria transferi-lo definitivamente para Brasilia, reduzir o número de profissionais de seu quadro e aumentar o financiamento de projetos externos.
Nos corredores e salas de pesquisadores do Ipea no Rio há duas expectativas em relação ao tratamento que será dado ao órgão pelo futuro titular da Secretaria de Assuntos Estratégicos (SAE) da Presidência da República, Wellington Moreira Franco. A primeira tem viés regional: por ser Moreira um político de origem carioca, espera-se uma valorização do braço local do instituto de pesquisa que, segundo essa avaliação, perdeu muito prestígio sob a presidência do paulista Marcio Pochmann, oriundo da Universidade de Campinas (Unicamp).
Historicamente, o Rio concentrou as principais divulgações de trabalhos do Ipea, especialmente os dados de conjuntura que tinham divulgação mensal. Hoje, embora a diretoria de estudos macroeconômicos permaneça na sede fluminense do instituto, a periodicidade da divulgação é trimestral e seu novo formato retirou muito do interesse que o boletim de conjuntura do Ipea despertava no mercado, pois fazia previsões de indicadores macroeconômicos importantes.
Há como pano de fundo da questão regional também uma disputa ideológica. Durante muitos anos a hegemonia do pensamento macroeconômico no Ipea esteve com os setores mais alinhados com a chamada visão ortodoxa, caracterizada pela tendência a preconizar políticas fiscal e monetária apertadas, sempre ajustadas a que as forças do mercado tenham liberdade para definir os rumos da economia.
A PUC-Rio e a Fundação Getúlio Vargas (FGV) são os maiores mananciais de cérebros ligados a essa corrente que predominou no governo Fernando Henrique Cardoso e no primeiro mandato do presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Com a chegada de Pochmann à presidência do órgão chega também a vez dos economista heterodoxos, cuja ênfase no papel do Estado como indutor do crescimento econômico supera as preocupações com o controle dos gastos públicos e com o ajuste da taxa de juros.
Unicamp, em São Paulo, e a Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), do atual diretor de Estudos Macroeconômicos do Ipea, João Sicsú, no Rio, são os dois principais núcleos nacionais dos economistas alinhados a essa última corrente.
Mas em um ponto bem distante do infinito as duas linhas aparentemente paralelas convergem: no horror a que uma indicação puramente política possa colocar na presidência do Ipea um nome divorciado das suas características de órgão de pesquisa e de planejamento, com a consequente perda da reputação adquirida em mais de 45 anos de história.
Alguns avaliam que a transferência do Instituto do comando do Ministério do Planejamento para o da SAE, ocorrido neste governo, potencializa esse risco. Como a SAE tem sido recentemente desaguadouro de nomes pouco prestigiados no núcleo central do poder, o prestigio do próprio Ipea estaria sendo também progressivamente minado.
A luta pelo retorno do Ipea ao guarda-chuva do Planejamento é defendida de forma consensual pelos funcionários do instituto. Mas no momento, a questão é mais de sobrevivência, de evitar que essa casa de excelência das pesquisas econômicas seja conspurcada pelo oportunismo político. Economistas de renome no contexto nacional estão deveras preocupados com o que possa vir a acontecer ao Ipea e já expressaram sua aflição à presidente eleita Dilma Rousseff.
A direção do Ipea, em nota oficial divulgada ontem, informou que não comentaria nada sobre o assunto.
Fonte: Valor