Ótimo artigo do L.C.Mendonça de Barros, no jornal da Ditabranda, sobre a crise econômica na zona do euro. Não compartilho o pessimismo em relação ao Brasil e tão pouco considero o projeto da união monetária um doente em estágio terminal. A situação é grave, porem, ainda administrável. O problema, como muito bem observa Mendonça é a ausência de lideres a altura na zona do euro. Ai mora o grande perigo.
Algum sábio esquecido pelo tempo dizia que as crises financeiras, quando não enfrentadas com eficiência na sua origem, acabam por ganhar pernas próprias. Nada mais verdade para o analista que acompanha o desenrolar dos acontecimentos na Europa.
A crise começou como um animal de poucas pernas -a medíocre e pequena economia grega- e hoje se transformou em um monstro assustador de muitas pernas. Entender sua complexidade é um exercício muito difícil para o analista, principalmente porque estamos entrando na fase do pânico entre os investidores.
O que mais me assusta é a falta de um diagnóstico profundo da crise e de uma agenda de ações para enfrentá-la. Nesse vazio de líderes do escopo daqueles que criaram a Europa Unida -Adenauer, De Gaulle, Mitterrand e Kohl-, as dificuldades ficam ainda maiores. Os mercados assistem -já há mais de dois meses- a um incrível e ridículo espetáculo de divergências e ameaças entre aqueles que deveriam estar liderando o processo de enfrentamento da crise.
No início, quando o monstro a ser enfrentado não inspirava medo a ninguém, os líderes de direita conservadora da Alemanha, da Holanda e de outros países do norte europeu se posicionaram contra qualquer ajuda aos gregos. Tiveram a mesma reação estúpida do governo Bush, em setembro de 2008, quando o banco Lehman Brothers entrou em dificuldades. Com isso, deixaram o pânico dos investidores chegar a Irlanda, Portugal e Espanha e acabaram por criar uma crise de confiança em quase toda a dívida pública europeia. Em outras palavras, passamos de uma crise conjuntural para uma sistêmica.
Talvez naquele momento inicial uma ajuda de poucas dezenas de bilhões de euros fosse suficiente para lidar com os fantasmas da Europa.
Mas questões ideológicas e políticas paralisaram as ações dos líderes das nações mais poderosas por várias semanas, com declarações contraditórias e infantis entre os principais atores desse drama que ameaça virar uma ópera-bufa. Quando acordaram para a gravidade do descrédito no arranjo europeu que havia tomado conta dos mercados, a crise tinha vários pares de pernas assustadoras.
Como sempre acontece, foi ao longo de um fim de semana tenso que os governos europeus resolveram agir, e o pacote de US$ 1 trilhão para apoiar os países em dificuldades foi aprovado. Mas nesse momento as dúvidas e os medos dos investidores já eram muito maiores e nem mesmo essa montanha de dinheiro público conseguiu trazer de volta a confiança no euro.
Quando escrevo esta coluna, os mercados financeiros no mundo todo estão em queda vertiginosa, com os investidores fugindo de qualquer ativo financeiro que tenha algum risco. Nem mesmo as moedas de países com forte crescimento -cito o Brasil, a Austrália e a Coreia- escapam da "débâcle". A ordem é vender tudo e aplicar em títulos de crédito nas duas únicas moedas -dólar e iene- vistas como seguras. E isso é o que mais me preocupa.
Esse comportamento ultraconservador dos investidores pode provocar um efeito dominó em todo o mundo e abortar a retomada do crescimento econômico em áreas que não sofrem da doença europeia.
Aprendi com meus médicos pessoais que a recidiva de uma doença é sempre uma situação mais delicada do que a original. E poderemos ter em poucos meses uma recidiva de crise deflacionária de pouco tempo atrás.
Fonte: FSP