quarta-feira, 5 de maio de 2010

Presente de grego

Mais um ótimo artigo do Martin Wolf.Pessimista? Não, apenas realista. Alguma forma de moratoria negociada/reestruturação da dívida parece inevitável. Vai ter impacto negativo no grande bananão? Acredito que não, exceto se for um preambulo para uma crise em escala maior englobando outros mercados. Esta é uma possibilidade,mas ainda não chegamos lá.


Momentos de desespero requerem medidas desesperadas. Depois de meses de dispendiosa postergação, a zona do euro fechou um enorme pacote de apoio à Grécia. Ao envolver o FMI, a pedido da Alemanha, os países europeus conseguiram alguns recursos adicionais e um programa melhor. Mas será que vai funcionar? Infelizmente, tenho sérias dúvidas.
Duas características do que foi decidido merecem menção. Primeiro, não haverá reestruturação da dívida; segundo, será suspenso o requisito de uma classificação mínima de crédito para os ativos garantidos pelo governo grego utilizados nas operações de liquidez, o que oferece alguma assistência aos vulneráveis bancos locais.
Assim, será que o programa é sensato, quer para a Grécia, quer para a zona do euro? Sim e não, em ambos os casos.
Comecemos pela Grécia. O país já perdeu o acesso aos mercados. Assim, a alternativa a aceitar esse pacote seria decretar uma moratória.
O país nesse caso deixaria de pagar os juros sobre suas dívidas, mas teria de reduzir seu deficit fiscal primário (ou seja, anterior aos pagamentos de juros) para 9% a 10% do PIB imediatamente. Isso resultaria em um aperto muito mais brutal do que aquele que a Grécia aceitou como parte do pacote.
Além disso, uma moratória traria o colapso do sistema bancário. A Grécia está certa em prometer mundos e fundos, a fim de ganhar tempo e eliminar de maneira mais suave o seu deficit primário.
Mas é difícil acreditar que a Grécia venha a ser capaz de evitar uma reestruturação da dívida. Primeiro, presumamos que tudo corra de acordo com o plano. E que a taxa média de juros sobre a dívida grega de longo prazo fique em apenas 5%.
O país precisaria, com isso, manter um superavit primário da ordem de 4,5% e dedicar o equivalente a 7,5% do PIB de sua arrecadação tributária para manter o serviço da dívida.
O público grego será capaz de suportar esse fardo ano após ano, sem descanso?
A Grécia está sendo solicitada a fazer o que a América Latina fez nos anos 80. Isso resultou em uma década perdida, da qual os únicos beneficiários foram os credores estrangeiros.
Além disso, já que os credores agora estão sendo pagos para escapar, quem os substituirá? O pacote certamente fracassará em seu objetivo de devolver a Grécia aos mercados, em termos administráveis, dentro de poucos anos.
Para a zona do euro, duas lições são claras: primeiro, a escolha é ou permitir moratórias de dívidas soberanas, por mais complicadas que sejam, ou criar uma união fiscal, com forte disciplina e fundos suficientes para permitir o amparo a economias devastadas.
Segundo, os ajustes na zona do euro não funcionarão sem que os países mais importantes realizem ajustes compensatórios. Se a zona do euro estiver disposta a viver próxima da estagnação em sua demanda geral, ela se tornará uma arena para medidas agressivas de desinflação competitiva e dependerá mais dos mercados mundiais como destino para seus excedentes de produção.
A crise que está em curso confirma a sabedoria daqueles que viam o euro como uma empreitada de alto risco. No entanto, agora que a zona do euro foi criada, é preciso fazer com que ela funcione. A tentativa de resgate à Grécia é só o começo da história. Há muito mais que precisa ser feito, em termos de resposta imediata à crise e de reforma da zona do euro, em futuro não muito distante.

Fonte: FSP