quarta-feira, 25 de junho de 2008

Clodovis Boff e a Teologia da Libertação

Inesperado e um choque para todos, principalmente para o que resta da turma da Teologia da Libertação, o texto do Clodovis Boff tem tudo para ser um divisor de águas. Para um leigo, como é o meu caso, o argumento central do texto não é novo e a surpresa maior é em relação ao longo período necessário para que alguem importante finalmente reconhecesse o que já era obvio no inicio dos anos 80. Abaixo reproduzimos alguns trechos do documento que pode ser lido no seguinte endereço:
http://www.adital.com.br/site/noticia.asp?lang=PT&cod=33508. No adital é possível acessar algumas respostas ao texto do Clodovis Boff.

“Ora, quando o pobre adquire o estatuto de primum epistemológico, o que acontece com a fé e sua doutrina no nível da teologia e também da pastoral? Acontece a instrumentalização da fé em função do pobre. Cai-se no utilitarismo ou funcionalismo em relação à Palavra de Deus e à teologia em geral.”
(...)
Se grave é, pois, a questão e graves seus equívocos, graves são também seus resultados. Pois o princípio informa todo um discurso. Quando se começa uma caminhada na direção errada, quanto mais se avança, mais se distancia do destino. E assim também os frutos da TdL, que são reconhecidamente notáveis, acabam "pegando broca" e com o tempo se deteriorando.
O resultado geral da inversão prática de princípio (de Deus para o pobre) é enfraquecer e mesmo esvaziar a identidade cristã, e isso em vários planos:
1. No plano teológico. A teologia vai perdendo seu caráter próprio, para adotar um tom mais sociológico e pólítico, agora de tipo religioso‐pastoral. Perde também fecundidade teórica, suas produções reduzindo‐se cada vez mais a serem meras "variações sobre o mesmo tema". Pior, as grandes intuições da TdL viram chavões repetidos ad nauseam, sobretudo na "vulgata militante" da TdL.
2. No plano eclesial. A "pastoral da libertação" se torna um braço a mais do "movimento popular". A Igreja se "onguiza". Então se esvazia mesmo fisicamente: perde agentes, militantes e fiéis. Os "de fora", à exclusão dos militantes, sentem escassa atração por uma "igreja de libertação". Pois, para o compromisso, dispõem das ongs, mas para a experiência religiosa precisam mais que de simples libertação social. Ademais, por não perceber a extensão e relevância social da atual inquietação espiritual, a TdL se mostra culturalmente míope e historicamente anacrônica, ou seja "alienada" de seu tempo.
3. No plano da própria fé. Reduzida a ideologia mobilizadora, a fé vai perdendo cada vez mais substância, até se esvaziar totalmente. O que sobra é uma "hermenêutica cristã da existência humana", tal como se exprime de modo modelar na vulgata teológica chamada "rahnerismo", que subjaz à TdL e que aqui não é possível discutir. Em suma, a substância da fé acaba em mero discurso, portanto, em qualquer coisa de irrelevante. Pois, como se ouve nos meios "liberacionistas", o que importa não é tanto a Igreja ou Cristo, quanto o Reino.
(...)
o "urgentismo histórico" levou a investir o quanto pode, do conteúdo da fé, no que foi tido como o opus maius: a libertação histórica dos oprimidos. Daí também a tentação de "qualqueirismo epistemológico" à la Feyerabend: anything goes em teologia, desde que os pobres tirem disso vantagem.
(...)
Efetivamente, a metodologia de Aparecida é uma metodologia originária e principal, enquanto a outra só pode ser derivada e subalterna. Por isso também a primeira é mais ampla. Pois, se Bento XVI foi teologicamente certeiro quando, abrindo a V Celam, declarou: "a opção pelos pobres está implícita na fé cristológica", então fica claro que o princípio-Cristo inclui sempre o pobre, sem que o princípio‐pobre inclua necessariamente Cristo. Por outras palavras: para ser cristão é preciso absolutamente se comprometer com o pobre: agora, para se comprometer com o pobre, não é, em absoluto, necessário ser sempre cristão."