O Bruxo realmente anda inspirado e tem toda razão. A reação ao artigo dele é muito mais comum do que se imagina: o desconhecimento do pensamento do keynes e das políticas keynesianas é amplo geral e irrestrito. No QG Anticatólico - onde, para vários iletrados em teoria econômica, o que conta em economia começa e termina com o barba - esta tem sido uma luta inglória.
Há duas semanas , publicamos nesta mesma coluna um "suelto" no qual reconhecíamos que o New Deal do presidente Roosevelt ajudou a superar os aspectos mais dramáticos da profunda recessão instalada em 1929 nos Estados Unidos, que era então, como é hoje, o coração do "capitalismo". Por outro lado, sugerimos que a "glamourização" do New Deal como uma política "keynesiana" era equivocada.
A singela "prova" que apresentamos foi a seguinte: em 1937, a receita pública cresceu em resposta às ações do New Deal, mas o nível do PIB estava longe do "equilíbrio", (a taxa de desemprego era de 15%) e a expansão monetária (juntamente com o "corporatismo" criado pelo New Deal) produziu uma inflação de 4,7% (com o nível dos preços muito abaixo dos de 1929). A resposta de Roosevelt foi produzir um superávit fiscal e (através do Fed) aumentar a taxa de juros, o que gerou uma nova recessão em 1938, quando o PIB caiu 4,6%!. Tudo claro, simples e aborrecidamente numérico!
Felizmente, não. Fui honrado com meia dúzia de observações de leitores civilizados. Descobri que existe uma seita de adoradores do "keynesianismo hidráulico" tão desinformada sobre o papel do "mercado" (suas virtudes e problemas e sua relação com o Estado) quanto a seita dos "neoliberais", que, agora, depois da crise, tem um "ar de cachorro que caiu do caminhão de mudança"...
Para tranquilizar mentes e corações dos keynesianos hidráulicos mais sanguíneos, gostaria de sugerir-lhes a leitura do artigo (hoje clássico) do grande economista E.C. Brown, "Política Fiscal nos Anos Trinta: uma Reavaliação" ("The American Economic Review", Vol. XLVI, December 1956: 857-879), cuja conclusão é clara e irrefutável: "A política fiscal (obviamente, a de inspiração keynesiana) nos anos 30 parece não ter sido bem sucedida, não porque não funcionou, mas porque não foi tentada". Vão gostar. Estão lá todos os velhos fantasmas que nos assombraram nos anos 50 do século passado.
Para os detratores do poderoso Maynard, transcrevo frases (tradução livre) de uma carta que ele enviou a Roosevelt (1º de fevereiro de 1938): a política de 1937 "foi um erro de otimismo". Nela dá dois conselhos: 1º) "renovar os esforços no gasto público" e 2º) tentar cooptar o setor privado: "você pode fazer o que quiser com ele"... "mas, sem realinhá-lo no esforço comum, a recuperação não acontecerá". Este, aliás, é um bom conselho para certas autoridades brasileiras cujo autismo é manifesto.
Delfim Netto