Não é nada fácil evitar uma reação emocional ao último escarnio da figura menor que ocupa a vaga que deveria estar reservada, apenas, aos grandes juristas. Indignar-se, mais uma vez, ... confesso que já estou ficou cansado , mas resignar-se, ah! isto nunca. Paciência, paciência, é necessário, já que o problema é antigo, como atesta o texto abaixo, do Rui Barbosa, de 17.12.1914.
"A FALTA DE JUSTIÇA, A FONTE DE TODO O NOSSO DESCRÉDITO
O SR. RUI BARBOSA – A falta de justiça, Srs. Senadores, é o grande mal da nossa
terra, o mal dos males, a origem de todas as nossas infelicidades, a fonte de todo nosso
descrédito, é a miséria suprema desta pobre nação.
A sua grande vergonha diante o estrangeiro, é aquilo que nos afasta os homens,
os auxílios, os capitais.
A injustiça, Senhores, desanima o trabalho, a honestidade, o bem; cresta em flor
os espíritos dos moços, semeia no coração das gerações que vem nascendo a semente da
podridão, habitua os homens a não acreditar senão na estrela, na fortuna, no acaso, na
loteria da sorte, promove a desonestidade, promove a venalidade...
O SR. ALFREDO ELLIS – Promove a relaxação.
O SR. RUI BARBOSA – ...promove a relaxação, insufla a cortesania, a baixeza,
sob todas as suas formas. (Muito bem).
De tanto ver triunfar as nulidades, de tanto ver prosperar a desonra, de tanto ver
crescer a injustiça, de tanto ver agigantarem-se os poderes nas mãos dos maus, o
homem chega a desanimar da virtude, a rir-se da honra, a ter vergonha de ser honesto...
(Muito bem).
Essa foi a obra da República nos últimos anos.
No outro regímen, o homem que tinha certa nódoa em sua vida era um homem
perdido para todo o sempre – as carreiras políticas lhe estavam fechadas. Havia uma
sentinela vigilante, de cuja severidade todos se temiam e que, acesa no alto, guardava a
redondeza, como um farol que não se apaga, em proveito da honra, da justiça e da
moralidade gerais. (Muito bem).
Na República os tarados são os tarudos. Na República todos os grupos se
alhearam do movimento dos partidos, da ação dos Governos, da prática das instituições.
Contentamo-nos hoje com as fórmulas e aparência, porque estas mesmo vão se
dissipando pouco a pouco, delas quase nada nos restando.
Apenas temos os nomes, apenas temos a reminiscência, apenas temos a
fantasmagoria de uma coisa que existiu, de uma coisa que se deseja ver reerguida, mas
que, na realidade, se foi inteiramente. (Muito bem).
E nessa destruição geral das nossas instituições, a maior de todas as ruínas,
Senhores, é a ruína da justiça, colaborada pela ação dos homens públicos, pelo interesse
dos nossos partidos, pela influência constante dos nossos Governos. E nesse
esboroamento da justiça, a mais grave de todas as ruínas é a falta de penalidade aos
criminosos confessos, é a falta de punição quando se aponta um crime que envolva um
nome poderoso, apontado, indicado, que todos conhecem, mas que ninguém tem
coragem e apontá-lo à opinião pública, de modo que a justiça possa exercer a sua ação
saneadora e benfazeja.
Mas, Sr. Presidente, nesta eliminação monstruosa do sentimento jurídico e da
ação judicial nesse desenvolvimento rapidamente crescente do princípio de
irresponsabilidade, dominando o princípio da responsabilidade – que é o princípio
fundamental das instituições republicanas – porque a República é o governo dos
homens sujeitos à lei, debaixo de uma responsabilidade inevitável, por seus atos;"